segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Morre aos 75 anos Angela Ro Ro, ícone irreverente da MPB

Cantora e compositora, pioneira ao assumir sua homossexualidade no Brasil, enfrentava problemas de saúde e dificuldades financeiras nos últimos anos

Morreu nesta segunda-feira (8), aos 75 anos, a cantora e compositora Angela Ro Ro, uma das vozes mais marcantes e inconfundíveis da música popular brasileira. A artista estava internada desde junho, no Rio de Janeiro, quando desenvolveu um quadro de infecção pulmonar grave e precisou ser submetida a procedimentos delicados, como traqueostomia e diálise. Segundo pessoas próximas, a causa da morte foi uma parada cardíaca decorrente de complicações cirúrgicas.

A notícia foi confirmada por Laninha Braga, ex-namorada que vinha acompanhando de perto a rotina hospitalar, e pelo produtor musical Paulinho Lima, amigo íntimo e parceiro de longa data.

Últimos meses de luta e pedidos de ajuda
Nos últimos anos, Angela vinha enfrentando problemas de saúde recorrentes, agravados por dificuldades financeiras. Em maio, ela usou as redes sociais para pedir apoio aos fãs, relatando que sobrevivia com apenas R$ 800 de direitos autorais mensais. “Sem perspectiva de alta ou cura para trabalhar, humildemente peço ajuda a vocês”, escreveu em uma publicação que sensibilizou admiradores e colegas de profissão.

Durante a internação, a cantora chegou a apresentar momentos de melhora. Em agosto, após semanas de tratamento intensivo, voltou a falar após a traqueostomia e ganhou um site oficial para receber doações. O esforço da rede de apoio formada por amigos, ex-companheiras e fãs evidenciou o carinho que sempre despertou no público, mesmo em meio às adversidades.

Uma carreira marcada pela ousadia
Nascida em 5 de dezembro de 1949, no Rio de Janeiro, Angela Maria Diniz Gonçalves — que adotou o nome artístico Angela Ro Ro, inspirado na onomatopeia da gargalhada — despontou como uma revelação da música brasileira na década de 1970. Sua voz rouca e poderosa, aliada a composições carregadas de emoção, conquistaram público e crítica desde o primeiro disco, lançado em 1979.
O álbum de estreia, considerado um marco da MPB, trouxe clássicos como “Amor, Meu Grande Amor”, “Compasso” e “Fogueira”. Ainda nos anos 1980, consolidou sua carreira com trabalhos como Escândalo (1981), inspirado em um término conturbado, e seguiu compondo músicas que falavam de amor, dor e intensidade.
Angela Ro Ro também deixou sua marca em parcerias com grandes nomes da música brasileira. Dividiu o palco e o estúdio com artistas como Maria Bethânia, Marina Lima, Caetano Veloso e Cazuza, com quem cultivou amizade e cumplicidade artística.

Pioneirismo e representatividade
Mais do que cantora e compositora, Angela foi símbolo de autenticidade. Tornou-se uma das primeiras artistas brasileiras a assumir publicamente sua homossexualidade, nos anos 1980, em um cenário cultural e social ainda marcado por tabus e preconceitos. A atitude lhe rendeu respeito de muitos, mas também críticas e dificuldades em uma carreira que nunca se rendeu às pressões da indústria.
O relacionamento com a cantora Zizi Possi, no início da década, tornou-se um dos episódios mais comentados de sua vida pessoal. O término turbulento, que ganhou repercussão nacional, inspirou parte de sua obra e reforçou sua imagem de artista visceral, que transformava vivências íntimas em canções de impacto.
O legado de uma voz inesquecível
Angela Ro Ro deixa para a música brasileira um repertório rico, composto por mais de uma dezena de álbuns e sucessos que atravessaram gerações. Sua irreverência, sua risada inconfundível e sua entrega às canções a transformaram em referência de coragem e liberdade.
Entre altos e baixos, manteve-se fiel a si mesma, sem abrir mão da intensidade que marcou cada fase de sua trajetória. Ícone da MPB e pioneira em muitos sentidos, Angela será lembrada não apenas por suas canções, mas também por sua postura diante da vida: irreverente, autêntica e profundamente humana.

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